Da leveza.
- Karen Dias Jones
- 7 de dez. de 2020
- 2 min de leitura

No livro “A insustentável leveza do ser” de Milan Kundera, somos confrontados com uma frase marcante:
"O drama de uma vida pode sempre ser explicado pela metáfora do peso. Dizemos que temos um fardo sobre os ombros. Carregamos esse fardo, que suportamos ou não. Lutamos com ele, perdemos ou ganhamos. O que precisamente aconteceu com Sabina? Nada. Deixara um homem porque quis deixá-lo. Ele a perseguira depois disso? Quis vingar-se? Não. Seu drama não era de peso, mas de leveza. O que se abatera sobre ela não era um fardo, mas a insustentável leveza do ser."
O que Sabina sentia não era peso, sentia leveza, a leveza que por si só, tornava-se insustentável. O mesmo autor também afirma no livro que o peso é reflexo de “uma vida real, verdadeira, próxima da terra.” O homem do texto aceitou o término, logo, parecia que a relação vivida tão intensamente não tinha peso, não tinha importância. Quase etéreo, espaçando-se no ar, escapando pelos dedos como água fluida…
Estas duas frases explicam algumas das angústias vividas por muitos na clínica. As dores acabam por vir não do peso de uma vida repleta de atividades e estresse, mas sim, pela falta desta vida. A falta de uma relação feliz, de filhos (para quem sonhava em tê-los), de um compromisso real em algo, de uma profissão identificada.
A vida está leve, leve demais para se viver, levemente insustentável.
E isto desmascara algumas de nossas escolhas. É por esta razão que podemos estar envolvidos em relações que só nos trazem peso. Relações difíceis, ruins, angustiantes, mas que também trazem sentido, razão, sensação de receber amor, planos futuros. Angustia o peso da relação, mas angustia muito mais a leveza que ela trará quando se ausentar.
A dor parece estar localizada exatamente no medo de enfrentar esta aterrorizante leveza. Alguns sujeitos viveram por tanto tempo carregando fardos pesados, que não sabem e não conseguem viver de forma diferente. Não carregar peso pode parecer semelhante a estar sem vida, sem uma vida conhecida, uma vida sem peso e sem valor.
Será que o peso que nos acompanha está associado ao nosso medo de encontrar a leveza? De nos encontrarmos livres dos outros e assim, próximos de escolher livremente nosso próprio caminho sozinhos?
Qual seria a medida de peso ideal para ti, para que encontre o ponto de valorizar sua existência?
Tens escolhido a pena ou a âncora?
Design Rony Glória.
Photo by Paul Gilmore on Unsplash
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