Mentiras no divã.
- Karen Dias Jones
- 5 de out. de 2020
- 2 min de leitura
Sobre a verdade em psicoterapia.

Uma amiga minha, alguns anos atrás, veio me contar o quanto ela estava se divertindo ao enganar a psicóloga dela. Disse-me aos risos que ela não havia percebido, como nós psicólogos poderíamos ser tão inocentes?
Pedi que ela relatasse o que estava dizendo nas sessões e ela disse que estava a contar uma história de conto de fadas, mais precisamente sobre a Cinderela, e contava como se fosse a história real dela. Relatou a infância da personagem, a vida e o casamento da Cinderela.
Perguntei como estava no casamento e... Bingo! Ela estava se separando. Ficou atônita e me perguntou como eu havia descoberto.
Simples. Não há mentira na clínica.
Como assim Karen?
A mentira é uma criação, uma história desenvolvida pelo autor, um eu falso “eu” que o roteirista tenta criar. Essa mentira diz uma verdade, porque toda mentira relata uma verdade, nem que essa verdade diga somente sobre o contador. A criação da mentira esconde em si uma verdade do sujeito.
A escolha pelo conto de fadas não foi aleatória, a mentira proposital dentro de uma sessão de psicologia não foi aleatória, ter a sensação de ter o controle sobre o saber e a inocência do outro não foi aleatório. Ao contrário, afirmava somente verdades, verdades sobre ela.Sobre como um conto de fadas é, de fato e na atuação dela uma constatação, uma grande mentira. Opa! Atuou mentira informando sobre a vida ser uma mentira. Parece confuso?
O deboche ao outro reafirmava sua decepção/deceção com as histórias que as pessoas contam sobre a vida e finais felizes. Obviamente estava a falar do seu oposto, sobre um final triste.
A “verdade” nada mais é do que o ponto de vista do narrador, sua sensação de como o fenômeno ocorreu a partir de sua perspectiva. Logo, somente existe o fenômeno para quem o experienciou.
Para o psicólogo importa essa verdade, essa verdade outra que o sujeito está a relatar. E você? Quais mentiras tem contado para os outros?
Mais importante: Quais mentiras você tem contado para si mesmo?
Conheça-se. Faça psicoterapia.
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